Eu quero ser um instante
Mozileide Neri
Dá-me tua mão insólita
acaricia minha cor mais distante
abraça-me, não me deixa ir embora.
Sussurra palavras imaginárias
não me deixa no silêncio.
Eu quero ser um instante
uma tarde de outono
uma lembrança qualquer.
Quero ser o número zero
um reflexo de qualquer coisa
um espelho ao contrário
quero ser a perspectiva da Loucura.
Quero [Desejo] Ser aquela imagem sem lógica.
Elara (soneto 13)
Marcüs Beaumont
Ponteiras de aço divino
Atravessando a morte encarnada
Em anjo caído, que não sente nada
Além do ódio que é corroído
Icarus seus dentes assassinos
Asas queimadas, tatuagens negras
Vertem infecção e dor, trevas
Condenações em volta sem destinos
Como máquina guiada e insana
Alimentada pela revolta seqüestrada
Contar a vontade, rendido em fraqueza
Elara deve morrer sem fama
Sem braços, pernas e decapitada
Seguindo a ordem das profundezas...
>Sem Título<
João Correia
Sou a mortalha de quem fui
Num longínquo passado
Que quero deixar enterrado
Sem uma vela, nem resquícios de luz!
Sou um substrato dum passado
Onde o carbono era mais rijo
E o carvão fazia parte de minha constituição
Assim como hoje faz minha mão.
Não lembro daqueles tempos
Pelo menos finjo que deles me esqueci
Mas no subconsciente de meu sonhos
Vejo coisas que nesta vida nunca vi,
Ouço vozes que me soam familiares,
Vozes que nunca ouvi e não sei distinguir!
Hoje sou filho de mim mesmo
Em meu proscrito passado
Onde fui tudo, de assassino
A reles soldado.
Hoje também sou pai de mim mesmo
Em uma eterna gestação
Onde metamorfoseio-me
Para que num futuro
Quando eu irromper de meu casulo
Eu possa viver sem a aflição
De ser “humano, demasiado humano”
Este conflitante ser de mil facetas
Que não passa de poeira de cometas,
Este ser em eterna gestação!
Obscuridade
Glenda Way
Obscuridade,
Obscuridade que não me leva a nada!
Obscuridade que esconde quem eu realmente quero ser.
Obscuridade que afasta,
Obscuridade que machuca.
Obscuridade que dói.
Obscuridade que destrói.
Obscuridade que eu não quero ter.
Obscuridade que os outros querem ver.
Obscuridade, maldita obscuridade,
sem sorrisos, sem risadas, sem brincadeiras...
Vivo com a inveja, somos companheiras uma da outra.
A tristeza é outra grande amiga minha,
para onde eu vou, ela me acompanha,
somos inseparáveis...
A única esperança que eu tinha,
de um encontro com a felicidade,
saltou pela janela, foi a esperança que a jogou,
fugiu e me deixou junto a tristeza e a depressão a me abraçar.
Éramos nós três no trem da vida.
Elas continuarão me fazendo companhia
enquanto eu não escolher se quero continuar vivendo morta
ou morrer viva...
Riso com gosto de desespero
Bruna Barreto
Menino de corpo frágil
de olhos de ontem
riso sereno
com gosto de desespero.
Cabelos tingidos de roxo
Olhos vermelhos de sono
O fantasmagórico do teu mundo me fascina.
Menino que eu queria pra mim.
Um minuto de espera
e posso sentir você me olhando
me vendo às escondidas.
Cabelos tingidos por mim
Olhos vermelhos de mim
O irreal do teu mundo sou eu.
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Inclinar-se
Carol_gótica
Ao som do piano frio
ao leve e lírico entardece
eu me esgotei
larguei sem vestígios meus fios de silêncio.
Cobri sem força minha coragem de covardia
joguei fora minha vontade
e me inclinei
como quem se joga para o fim do precipício.
Eu me esvaziei,
gritei, sem razão para me salvar.
Larguei-me como quem se despede de alguém valioso.
Eu desisti,
Inclinei-me para cair no esquecimento:
primeiro veio o clarão depois a escuridão.
Quem me perdoará?